1. Condições de produção de uma prática escolar de iniciação científica
Desde 1999, o Colégio de Aplicação(*) desenvolve, junto aos 9ºs anos do Ensino Fundamental, uma proposta de ensino e pesquisa denominado “Pés na Estrada do Conhecimento ”, em alusão ao caráter andante de sua essência pedagógica, dada pelas rotineiras viagens de estudos. Naquele contexto fundador, estava em debate o desinteresse dos estudantes pelos conteúdos formais e a sensação dos proponentes, um professor de geografia e uma professora de história, de não estarem contribuindo efetivamente para a construção de sujeitos críticos frente as demandas políticas, socioeconômicas, ambientais, dentre outras, inerentes àqueles tempos. Desta forma, a proposta procurava associar o trabalho desenvolvido em sala aula, com a prática de saídas de campo, numa perspectiva interdisciplinar, visando a compreensão de aspectos da realidade dificilmente percebidos através somente do trabalho em sala de aula (Cruz, 1997; Silveira, Trott & Silva, 2007; Silveira, Rodrigues, Vandresen & Hoepers, 2015). Procuravam, então, buscar respostas para uma série de indagações, como por exemplo: como dar um tratamento pedagógico ao trabalho de campo, que rompesse com a representação de passeio? Como aproveitar as questões provenientes do trabalho de campo, para (re)alimentar uma determinada problemática proposta para/pelos estudantes? De que forma, após o campo, dar continuidade a este processo de ensinar e aprender?
Sem perder de vista sua especificidade “andante”, posteriormente passou a ser identificado como “Pés na Estrada do Conhecimento – Iniciação Científica na Escola”. Esta alteração se deu por ocasião da aproximação daquele coletivo de professores envolvidos com a proposta, no ano de 2007, com a noção de iniciação científica (IC) em contextos escolares. De início a proposta envolveu professores da área das Ciências Humanas, posteriormente ampliada pelo envolvimento de professores das Ciências da Natureza, Matemática e Linguagens. Estava em questão o movimento curricular da própria escola, nas tarefas relacionadas ao ensinar e o aprender problematizador.
A IC no Brasil, articulada em contextos escolares e proposta pelo Estado, tem uma versão inicial em 2003 com a criação do Programa de Iniciação Científica Júnior – PIC-Jr, encaminhada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq. Antes deste marco, outras experiências já se faziam presentes em algumas escolas brasileiras, encaminhadas pelo Programa de Vocação Científica – PROVOC, da Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz(*) , desde 1986. O programa governamental brasileiro, em grande medida, inspirou-se no modelo proposto pela citada fundação, incorporando princípios ligados a ideia de formação de talentos para a ciência e do despertar vocação científica (BRASIL, 2015).
Sem desconsiderar aproximação com as propostas referidas, a concepção de IC aqui relatada não se vincula aos objetivos de formação profissional ou mesmo da busca por “jovens talentos”, antes, propõe a formação de “jovens atentos” para questões que os situem no mundo de forma crítica e questionadora. Ao problematizarem essas questões, aprofundam outros olhares, inspirados, dentre outros, nos trabalhos de Freire (2005) e Santos (1998). Ao fomentar uma outra relação com saber (Charlot, 2000), a proposta em questão procura aproximar-se também de uma “formação para maior inserção social das pessoas no sentido de se tornarem aptas a participar dos processos de tomadas de decisões conscientes e negociadas em assuntos que envolvam ciência e tecnologia” (Linsingen, 2007, p. 13). Desta forma, a prática pedagógica de IC em apresentação tem como objetivo propor um olhar diferenciado sobre o trabalho na sala de aula, enquanto ambiente de pesquisa e construção do conhecimento, sintonizado com as múltiplas questões da realidade que cercam os estudantes, na perspectiva da formação de consciência crítica e cidadã.
2. Luz, câmera, ação e muito chão: a dinâmica da iniciação científica na escola
Embora presente no desenho curricular do Colégio de Aplicação desde 1999, como já referido, apenas em 2010 é que a proposta de IC, encaminhada pelo projeto “Pés na Estrada do Conhecimento”, conquistou efetivamente espaço junto ao elenco disciplinar dos 9ºs anos(*). Sendo assim, juntamente aos saberes escolares tradicionalmente vinculados a este nível de ensino, a IC passou a ocupar lugar interdisciplinar, articulando saberes provenientes de diferentes campos do conhecimento. No dizer de Santomé (1998, p. 44), a “complexidade do mundo e da cultura atual leva a desentranhar os problemas com múltiplas lentes, tantas como as áreas do conhecimento existentes”.
A proposta escolar de IC, não apresenta uma dinâmica metodológica rígida, fechada em si mesma. A cada ano letivo, em função do contínuo processo de avaliação do processo pedagógico, rearranjos são realizados. Desta forma, o relato que segue refere-se ao ano de 2015, período este que coincide com o trabalho de campo realizado pelo primeiro autor, nesta instituição e na referida proposta de IC, por ocasião de sua pesquisa de doutorado. A referida proposta, em andamento, planejada para ser desenvolvida no período de 2014 a 2018, junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica da Universidade Federal de Santa Catarina, intitulada “Entre Dizeres e Silêncios sobre Iniciação Científica na Educação Básica: o Movimento de Sentidos na Escola”, tem como objetivo investigar as condições de produção de uma prática escolar de IC, desenvolvida no cotidiano do Ensino Fundamental, bem como os efeitos de sentidos deslocados quando esta prática é concebida como proposta pedagógica na escola.
Desta forma, o texto que ora apresentamos tem como propósito refletir sobre aspectos relacionados aos processos de constituição da autoria, no cotidiano escolar de estudantes(*) do Ensino Fundamental, bem como, sobre o potencial da prática pedagógica de IC , neste nível de ensino, no tocante ao debate em torno de temáticas que problematizem relações entre ciência, tecnologia e sociedade.
2.1- A constituição dos sujeitos do conhecimento enquanto pesquisadores e orientadores em uma prática de IC
O início do ano letivo traz novidades para os estudantes do 9º ano. O toque do sinal, anunciando a troca de professores para o início de uma nova aula, promove muito movimento no dia e horário de IC na escola(*). Na instituição em questão há três turmas de nonos anos, com uma média de 25 (vinte e cinco) estudantes por turma. Quando é dia e hora de IC, estes deixam suas salas de aula e novos grupos se formam. As três turmas originais, passam a compor 8 (oito) coletivos de pesquisa. O que os aproxima? Seus interesses investigativos, suas curiosidades, o desejo de moverem-se pela escola. A formação destes grupos se deu pelo fato de serem em número de oito os professores envolvidos com a proposta. Além de se movimentarem de um ambiente para outro, estudantes e professores, neste caminhar, vão assumindo outros lugares sociais na dinâmica curricular, respectivamente, de pesquisadores e orientadores.
Até que os estudantes compreendam o que está acontecendo, alguns encontros são realizados no auditório da escola, para que, aos poucos, a proposta de IC vá adquirindo contornos mais concretos. Atividades lúdicas, sessões de vídeos, anotações no diário de iniciação científica (DIC(*)) e muito debate em torno de questões relacionadas à ciência, tecnologia, papel da pesquisa e da escola, vão contribuindo para esse processo. Por fim, os estudantes são apresentados aos eixos investigativos, com os quais deverão conviver durante o primeiro semestre com a iniciação cientifica(*). Nesta fase, o tema central estimulador dos projetos de pesquisa, que serão desenvolvidos pelos pesquisadores, contemplou dimensões relacionadas à luta pela posse da terra no Brasil, com ênfase para o caso das populações atingidas por barragens e a geração de energia elétrica. Uma temática paradoxal, pois ao mesmo tempo que tem forte relação com o cotidiano de todos, já que trata da produção de energia elétrica, é pouco conhecida e discutida, ao menos no nível de ensino em questão e na perspectiva apontada.
Apresentada a temática, foram desenvolvidos encontros semanais, em forma de rodízio, onde os orientadores propiciaram debate inerente a cada eixo de pesquisa (Quadro 1). Os estudantes participaram de todos os encontros, para, a partir daí, decidirem pelos temas que lhes fossem mais significativos. Concluídas as atividades, bem como efetuadas as escolhas dos eixos investigativos, o coletivo discente teve um período de tempo para formar suas equipes que poderiam ser compostas por dois ou três membros.
.Quadro 1 - Eixos investigativos da Primeira Fase – 2015
Eixo |
Possíveis problematizações |
1- As vidas “atravessadas” pelas ideias de progresso |
1 – O papel do jovem no seu contexto social; 2 – O agricultor familiar e os contextos impostos pelas barragens; 3 – Índios, caboclos e colonos dividindo o mesmo lugar; 4 – Transformações (econômicas, sociais, culturais) no cotidiano dos atingidos pelas barragens. |
2 – Lutas pela terra: Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e outras formas de resistência |
1- MAB e o processo histórico; 2- MAB em Santa Catarina: ações na luta pela terra; 3- A atualidade do Movimento dos Atingidos por Barragens. 4- Conceito de ”atingido”: antes e depois da Legislação; 5- Outras formas de resistência. |
3- As obras e a intervenção na natureza |
1- Impactos socioambientais decorrentes da construção de Usinas Hidrelétricas – o caso catarinense. 2- Legislação ambiental no Brasil; 3- Alternativas energéticas; 4- Relação Campo/Cidade: produção de energia e seus usos |
4- Identidade(s) e memória(s)
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1- Desterritorialização e identidade; 2- Impactos das transposições; 3- Memória(s) de quem… para quem… 4- Passado e futuro: idealizações no presente |
Uma vez formadas, as equipes formularam uma primeira versão de suas intenções investigativas. Importante registrar que, na dinâmica proposta, os estudantes têm liberdade de, considerando a temática geral, propor outras discussões. Os eixos e seus possíveis desdobramentos, apresentados através do quadro anteriormente citado, tiveram como propósito estimular o processo de identificação dos estudantes com o tema central. Caberia aos pesquisadores demarcarem suas escolhas. Concluída esta etapa, os orientadores discutiram as propostas criadas e as distribuíram entre si, tendo como critério a proximidade da proposta com os campos do saber nos quais possuíam maior afinidade (Gráfico 1). Feito isso, cada docente assumiu a orientação de um grupo composto por 8 (oito) a 10 (dez) pesquisadores.
O campo de formação do orientador nem sempre favorece ao desenvolvimento das problematizações propostas pelos pesquisadores. No entanto, sob este aspecto, necessário esclarecer que o orientador tem papel significativo no processo de iniciação científica, não apenas em questões relativas aos conteúdos específicos de sua formação acadêmica, mas também no tocante ao encaminhamento de soluções às dificuldades inerentes a todo esse processo. O que fortalece esse convívio é o permanente espaço de diálogo criado, em que o docente, em sua função de orientador, procura superar a “posição ingênua de quem se pretende detentor de todo o saber” (Gadotti, 1991, p. 69), antes, se coloca não apenas como aquele que “educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa” (Freire, 2005, p. 79).
2.2- A construção do conhecimento e do exercício de autoria
Uma vez organizados os coletivos, instaura-se a fase de construção do projeto de pesquisa. Tal tarefa não tem exigência tal como é pensada para a IC desenvolvida em cursos de Graduação ou em Programas de Pós-Graduação. Na verdade, trata-se de uma carta de intenções, contendo título, objetivos, problematização, metodologia, cronograma e referências, num formato tal que, respeitando o nível de escolarização dos estudantes, os coloque no processo de pensar de fato o que querem e como pretendem realizar a pesquisa. Desta forma, procura-se estabelecer uma outra relação com o saber que possibilite superar a tradicional passividade dos estudantes, em geral muito característico do sistema educacional nacional, para que os mesmos possam perceber-se “criticamente como estão sendo no mundo” (Freire, 2005, p. 83). É tarefa permanentemente mediada pelo orientador, um movimento constante de (re)escrita e apropriação dos saberes necessários ao entendimento dos problemas propostos. Desta forma, ao problematizar o papel da escola enquanto espaço de exercício da autoria (Cassiani, Almeida, 2005), enfatiza-se a formação dos estudantes afim de que se percebam como sujeitos sócio-históricos, que possuem e constroem histórias e sentidos sobre o mundo em que vivem (Charlot, 2000 & Orlandi, 2005). Assim, em decorrência da construção do projeto de pesquisa, todos os pesquisadores participaram de um trabalho de geração de dados (Figura 1), oportunizado por uma viagem de estudos.
Figura 1- Momento de geração de dados: realização de entrevista com uma moradora da cidade de Itá (SC)
No ano de 2015, a viagem com três dias de duração e com cerca de 600 km de distância de Florianópolis, possibilitou aos pesquisadores e seus orientadores visitarem o interior do Estado de Santa Catarina, mais precisamente sua região Oeste e o Norte do Rio Grande do Sul (Figura 2) para, de acordo com as demandas de suas proposições, compreenderem o que estava acontecendo nos espaços visitados.
Figura 2- Percurso do trabalho de campo
A escolha por esses locais se deu em função de reunirem um conjunto de aspectos de significativa importância para as discussões propostas aos estudantes pesquisadores. Dentre estes aspectos destacamos a construção da Usina Hidrelétrica Itá (UHE Itá)(*) , iniciada nos anos 1980 e concluída em 2000, que atingiu 11 (onze) municípios de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, dos quais os que mais tiveram áreas alagadas foram Aratiba (RS) e Itá (SC). No caso catarinense, por exemplo, a sede urbana de Itá foi totalmente coberta pelas águas do rio Uruguai, provocando impactos ambientais, sociais, econômicos, demográficos. Em Aratiba, cidade vizinha à Itá, no Norte do Estado do Rio Grande do Sul, a formação de grupos de resistência à construção de usinas hidrelétricas, organizados em torno do Movimento dos Atingidos por Barragens, propicia a circulação de outras vozes, àquelas pouco ouvidas em processos desta natureza. Por fim, no tocante ao município de Abdon Batista, a entrada em operação no ano de 2013 da Usina Hidrelétrica Garibaldi, intensificou discussões envolvendo atores sociais como o poder público, população em geral, movimentos sociais, empresariado e religiosos, circulando discursos que os pesquisadores teriam de apreender. Sendo assim, o trabalho de campo constituiu rico processo de vivência política, trazendo à tona vigoroso debate em torno das relações entre ciência, tecnologia e sociedade. A circulação de diferentes discursos possibilitou ampliar o campo de visão dos pesquisadores na dinâmica na qual estavam inseridos (Quadro 2).
Quadro 2 - Atividades de geração de dados – pesquisa de campo
Local de visitação |
O que compreender |
Aratiba (RS) |
Impactos socioambientais locais; a organização do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB; os moradores e suas histórias. |
Abdon Batista (SC) |
Os dizeres das lideranças sociais locais. Discussões em torno do processo de construção e impactos sociais da Usina Hidrelétrica Garibaldi. |
Itá (SC) |
A Usina Hidrelétrica Itá; o espaço urbano; as Casas de Memória; os moradores e suas histórias. |
De retorno a Florianópolis, iniciaram a fase de tratamento dos dados gerados, de ressignificação de todos os conhecimentos que circularam no trabalho de campo. Como considerar tudo o que foi visto, ouvido, sentido? Ao finalizar o processo de pesquisa os estudantes pesquisadores construíram um ensaio escolar. Este gênero de escrita configura-se como uma produção textual, de exercício de escrita e autoria. A ideia de ensaio nos remete ao constante movimento de ensaiar a reflexão e a escrita, de dar materialidade discursiva às problematizações construídas ao longo do processo da pesquisa. Desta forma, procura estimular a produção do argumento.
A conclusão definitiva desta etapa de IC acontece após a realização de uma última tarefa: socializar com a comunidade escolar e/ou interessados às descobertas proporcionadas pela pesquisa. Tal evento, denominado “Seminário Iniciação Científica na Escola”, aconteceu nas dependências da instituição escolar, para o qual foram convidados familiares, professores, estudantes, pessoal técnico. O evento reuniu 34 (trinta e quatro) trabalhos. Nas salas das apresentações, além dos convidados, um grupo composto por 3 (três) debatedores (professores de outros anos e estudantes egressos) promoveram discussões com os apresentadores, num tom de diálogo e troca de experiências. Por meio do Quadro 3, um recorte dos trabalhos apresentados fornece pistas sobre a apropriação feita pelos pesquisadores em torno de questões envolvendo ciência, tecnologia e sociedade e os deslocamentos de saberes realizados pelos orientadores em seus respectivos campos do conhecimento.
Quadro 3 – Recorte das produções de iniciação científica
Título da pesquisa |
Área de conhecimento do orientador |
Quando a hidrelétrica bate na sua porta |
Biologia (Ciências) |
UHE´s e seus impactos na fauna e na flora – um estudo de caso da UHE Itá |
|
Potencialização das Usinas Hidrelétricas: uma solução eficaz? |
Geografia |
A barragem de Itá e os possíveis impactos educacionais aos jovens |
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Os direitos dos atingidos |
História |
Memórias de uma cidade inundada |
|
Os impactos e as mudanças causados pela construção da UHE Itá na identidade dos idosos |
Língua Espanhola |
O bem-estar das mulheres atingidas pelas barragens em Itá |
|
A compensação ambiental pela construção da usina hidrelétrica de Itá e seus desdobramentos. |
Língua Inglesa |
As lembranças de um passado esquecido: O impacto da construção de barragens da identidade e perspectiva de vida dos atingidos. |
|
A opinião dos moradores em relação à construção da UHE Itá, após 24 anos de transposição |
Língua Portuguesa |
Biogás, mais uma possível fonte de produção de energia elétrica na região de Itá-SC? |
|
Saúde e hidrelétrica |
Matemática |
Construção de hidrelétricas: infraestrutura de implantação |
3. Avaliando os caminhos já trilhados com a IC em contexto escolar
Tomando por base os relatórios das atividades propostas, bem como o processo de acompanhamento das atividades deste coletivo de sujeitos na escola, verificou-se que a proposta de IC em questão articula diferentes ações pedagógicas afim de atingir os objetivos propostos. Ao proporcionar o acesso ao conhecimento, tarefa comum aos espaços escolares, não o faz na perspectiva de uma educação bancária (Freire, 2005), já que interessa mais o processo de construção e problematização deste conhecimento. Nesta perspectiva, está posto uma formação para a inserção crítica dos sujeitos pesquisadores no mundo. Ao criarem perguntas, conhecerem lugares e pessoas, bem como procurarem respostas aos problemas sociais, os estudantes sentem-se com mais responsabilidade no processo de dizer. Desta forma, assumem-se enquanto autores quando contribuem para dirimir os problemas, apontam soluções e desenvolvem sensibilidades no que tange as diferenças socioculturais do mundo atual.
É consenso entre professores e estudantes, em seus lugares de orientadores e pesquisadores, que a experiência de iniciação científica possibilita uma relação outra com a escola e os saberes que circulam nela e fora dela. Distantes do objetivo centrado exclusivamente para a formação de jovens cientistas, transitam por um complexo caminho de formação humana em conexão com ideias de emancipação e cidadania, mesmo reconhecendo as dificuldades para tanto na dinâmica societária capitalista vivida.
Planejar aulas, atividades e avaliações são tarefas pedagógicas, em geral, dos professores. Quando os estudantes participam ativamente desta construção a escola passa a ter outros contornos. Esta forma de viver o currículo se concretiza quando o estudante-pesquisador decide sobre o que quer compreender, com quais objetivos e como desenvolverá este processo. Os estudantes possuem uma avaliação muito favorável a todo esse movimento do pedagógico na escola. Percebem as diferenças entre o proposto e o que acontece quando estão na sala de aula do cotidiano da escola, ou seja, compreendem que de fato é possível estabelecer outras formas de relação com a escola e o mundo em que vivem. Porém, percebemos em suas falas objeções quanto ao excesso de trabalho e o pouco tempo que têm para o amadurecimento das muitas ideias que circulam, mediante todas as outras exigências produtivistas próprias da forma escolar vigente.
Temáticas sociotécnicas constituem discussões relevantes quando trazidas para contextos escolares, ainda mais quando esse conhecimento é construído pelos próprios estudantes. Tais questões quando abordadas nos livros didáticos, em geral, são tratados de forma descontextualizada. Nesse sentido, promover ações que tragam a autoria para dentro de nossas escolas pode contribuir para a formação de sujeitos críticos e reflexivos em suas ações.