Sensos-e Vol: I Num: 1  ISSN 2183-1432
URL: http://sensos-e.ese.ipp.pt/?p=5078

Desenvolvimento do pensamento lógico utilizando o TOPOBO

Autor: Mateus Madail Santin Afiliação: Universidade Federal do Rio Grande - FURG
Autor: João Alberto Da Silva Afiliação: Universidade Federal do Rio Grande - FURG
Autor: Silvia Silva da Costa Botelho Afiliação: Universidade Federal do Rio Grande - FURG

Resumo: O trabalho usou um kit Topobo 100 peças, brinquedo desenvolvido no laboratório de mídia do MIT. Foi proposto o desenvolvimento de robôs que realizam determinadas tarefas, como "dizer não" em uma das atividades, referindo-se aos problemas típicos de algoritmos de programação que usam os operadores lógicos, como AND, OR e NOT. As atividades foram realizadas em uma escola pública na cidade de Rio Grande - RS, com crianças com idades entre 9 e 10 anos que nunca tiveram contato com o brinquedo. Os experimentos foram filmados e posteriormente avaliadas pelo grupo em vários aspectos. O aspecto motivacional que o Kit tem despertado nas crianças, em grande parte por causa da novidade e a questão tecnológica que tem artefato educacional, é discutido neste artigo.
Palavras-Chave: TOPOBO Algoritmos Robótica

Abstract: The work used a kit Topobo 100 pieces, toy developed at the MIT media lab. It was proposed the development of robots that carry out certain tasks, such as ’say no’ in one of the activities, referring to typical problems of scheduling algorithms that use logical operators such as AND, OR and NOT. The activities were held in a public school in the city of Rio Grande - RS, with children aged between 9 and 10 years who had never had contact with the toy. The experiments were filmed and subsequently evaluated by the group in several respects. The motivational aspect that Kit awakened in children, largely because of the novelty and technological issue that has educational artefact, is discussed in this article.

Keywords: TOPOBO robotics algorithms

Desenvolvimento do pensamento lógico utilizando o TOPOBO

Autor: Mateus Madail Santin Afiliação: Universidade Federal do Rio Grande - FURG
Autor: João Alberto Da Silva Afiliação: Universidade Federal do Rio Grande - FURG
Autor: Silvia Silva da Costa Botelho Afiliação: Universidade Federal do Rio Grande - FURG

Introdução

O uso das atividades de experimentação nos primeiros anos do Ensino Fundamental se faz necessário por possibilitar aos alunos uma aproximação e uma significação dos fenômenos computacionais dentro da escola. Ao contrário de outras ciências, como a Matemática e a Biologia por exemplo, a Computação é apresentada ao aprendiz tardiamente. Mesmo capazes de estabelecer conjuntos de procedimentos, alega-se que nos primeiros anos do ensino fundamental as crianças ainda não apresentam estruturas cognitivas capazes de representar simbolicamente, através das linguagens de programação existentes, os algoritmos associados a tais procedimentos. Se as atividades de experimentação em informática tornam-se significativas para os alunos, as ações a partir dessas atividades poderão ser também significativas para eles,     tornando-se, assim, a linguagem computacional parte de uma ação expressiva para o mesmo. Porém como trabalhar em sala de aula tais conceitos? Este trabalho traz os primeiros resultados de experimentação robótica realizado com um Kit Topobo de 100 peças. As atividades foram realizadas em uma escola pública na cidade de Rio Grande – RS, em uma turma de crianças com idades entre 9 e 10 anos. Estas crianças já participavam de atividades extra-curriculares junto ao grupo de pesquisa da universidade, o qual tem o foco na educação básica. Os experimentos foram filmados e avaliados em diversos aspectos pelo grupo. O artigo aborda o aspecto do brincar pedagógico e em seguida traz em detalhes os diversos tipos de comercialização do Kit robótico utilizado. Uma seção mostra a dinâmica utilizada em sala de aula, bem como as diversas metodologias testa- das, e analisa aspectos em cada uma. Por fim, traz uma análise do trabalho focado no aspecto motivacional observado durante os experimentos, com o foco na metodologia que melhor permitiu aos alunos realizarem as tarefas.

O brincar pedagógico

A brincadeira no contexto escolar é uma possibilidade de atuação pedagógica que auxilia os professores a promover o desenvolvimento e a aprendizagem das crianças (Vygotsky, 1991; Edda, 2003; Bichara, 2001; Silva, 2003). No mesmo sentido, Dohme (2002) descreve o brincar na escola como uma técnica em que são postos em prática os conceitos do construtivismo e da aprendizagem por meio da participação ativa do aluno de forma divertida e prazerosa. De acordo com Queiroz, Maciel, & Branco (2006), a brincadeira também favorece o desenvolvimento da autonomia, da criatividade e da responsabilidade das crianças quanto às suas próprias ações. Assim, nota-se que a articulação do potencial da tecnologia e da brincadeira, com as funções da escola, pode contribuir com a transformação dos processos educacionais. Nessa perspectiva, não encontra respaldo a aprendizagem passiva, caracterizada apenas pela absorção de informações, ou a ênfase nas tecnologias em detrimento dos aspectos pedagógicos, políticos, sociais e culturais constitutivos do ambiente escolar. É permitida à criança em um ambiente não coercitivo, coordenar suas ações para estruturar seus conhecimentos a partir de suas próprias concepções; formular hipóteses e testá-las; usar a iniciativa buscando solucionar problemas que fazem parte do seu interesse; organizar mentalmente suas ideias e expressá-las livremente e com convicção; interagir entre iguais coordenando outros pontos de vista aos seus, construindo regras de participação nas suas atividades, ajuizando em diversas situações o que é melhor para todos. Com isso, abrem-se oportunidades para superar seu egocentrismo, construindo relações que contribuem para o desenvolvimento do raciocínio coerente, e construindo valores sociais que a capacitam a interagir socialmente segundo a moral da cooperação decorrente do respeito mútuo (Brascher, 2000). A robótica é definida como a ciência dos sistemas que interagem com o mundo real, com ou sem intervenção humana (Ullrich, 1987). É uma área essencialmente interdisciplinar e constitui-se na interlocução entre disciplinas tais como: matemática, engenharia, computação, educação, psicologia, medicina, encontrando-se presente nos diferentes âmbitos da vida cotidiana, nos eletrodomésticos, nas montadoras de automóveis, nas intervenções médicas. No mundo contemporâneo, o robô está entrelaçado no cotidiano, e vem influenciando o nosso modo de viver e interagir, não somente com equipamentos mas também com os seres humanos. Segundo Ullrich[10], um robô é um equipamento multifuncional e reprogramável, projetado para movimentar peças, materiais e outros tantos dispositivos especializados para o desenvolvimento de inúmeras ações que promovem bem-estar, conforto, saúde e educação. Além disso, nota-se que a temática da robótica mobiliza nas crianças uma satisfação e curiosidade em dominar e interagir com os atuadores robóticos. Nesse sentido, a tecnologia pode ser um instrumento que potencialize o desenvolvimento de diversas habilidades e competências das crianças em função do seu caráter motivacional.

O kit TOPOBO

Nesta seção é apresentado o kit TOPOBO, os kits diferem na quantidade de peças ativas e passivas ou por possuírem um ativo diferenciado, denominado rainha. Esta pode agir como uma peça de atividade normal, como também ensinar outros ativos para imitar seu movimento. O nome TOPOBO é derivado das palavras topology, botanical, e robot, constituindo um sistema de modelarem em 3D que permite ser configurado de diferentes formas e programado para se mover fisicamente. A capacidade de representação 3D do TOPOBO permite que o aluno contextualize e crie objetos relacionados com a sua percepção.

Na figura 1 são ilustradas as peças passivas e a peça ativa. O TOPOBO é composto de dez blocos primitivos básicos que se conectam em diversas orientações.

FIGURA 1: Peças do TOPOBO

Nove destes blocos são chamados de peças “passivas”, pois formam ligações estáticas, sendo que quatro formas geométricas ocorrem em duas escalas. A décima primitiva, denominada “ativa”, é um circuito eletrônico envolvido por uma capa plástica composta de um motor associado a componentes eletrônicos, constituindo uma tecnologia embarcada embarcada(Parks, Raffle, & Ishii, 2008). Quando estas peças são unidas, cria-se uma rede peer-to-peer 1 descentralizada. Além dos componentes passivos com função meramente estrutural, o TOPOBO apresenta o conceito de memória cinética associada aos componentes ativos, a qual, por meio de um botão liga/desliga, permite que a manipulação de tais juntas possa ser registrada. O movimento de cada peça é feito a partir de uma replicarão do primeiro movimento, que é feito pelo sujeito que manipula o material. O usuário pode executar manualmente a movimentação de uma junta através da ação direta das mãos sobre as peças que, por estarem unidas, modificam o movimento da estrutura. Toda ação é salva na peça ativa que armazena o movimento realizado. Outra tecnologia disponível para a manipulação dos elementos é um tipo especial de dispositivo denominado rainha Queen. Este permite que o sistema replique a outras juntas de peças ativas, o movimento realizado, transmitindo a estas o mesmo movimento executado na rainha. Na figura 2 é mostrada a forma de programação de uma peça ativa que possui uma estrutura simples passiva, conectada na saída do motor.

FIGURA 2: Programando a peça ativa.

FIGURA 2: Programando com às mãos

Um TOPOBO ativo é programado por manipulação direta, onde cada ativo sincroniza os registros por ele mesmo. Para registrar um movimento um usuário pressiona o botão em um ativo, torce as peças ativas e produz um movimento na criação. Assim, realiza-se uma programação na forma de uma sequência de comportamentos. Ao pressionar o botão novamente, a criação imediatamente entra no modo de reprodução. Neste modo, é reproduzido o movimento de forma continua até que o botão é pressionado pela terceira vez para fazer com que o programa termine.

Materiais e Métodos

As oficinas estão fundamentadas no  conceito de design, que prioriza a concepção, visa o criar e não apenas utilizar ou interagir, a personalização que é criar algo que seja pessoalmente significativo e relevante, a colaboração, desenvolver o trabalho com outras pessoas no processo criativo e colaborativo e por fim a reflexão que é rever e repensar as práticas criativas de cada um. A aprendizagem baseada no conceito de design é particularmente adequada para a computação criativa, que apoia o desenvolvimento das ligações pessoais dos alunos com a computação, com base na criatividade, imaginação e interesses pessoais ou coletivos.

O aspecto pedagógico das oficinas do TOPOBO. Logo está fundamentado no construtivismo piagetiano. Piaget mostrou que, desde os primeiros anos de vida, a criança possui mecanismos de aprendizagem que ela desenvolve sem ter frequentado a escola. A criança aprende diversos conceitos matemáticos, por exemplo, o conceito de volume: – a criança tem a ideia de que em um copo alto e estreito pode ser colocado a mesma quantidade de líquido que em um copo mais gordo e mais baixo. Essa ideia ela aprende utilizando copos de diferentes tamanhos, sem explicitamente ter sido ensinado o conceito de volume.

A sua capacidade intelectual é desenvolvida quando a criança interage com os objetos do ambiente onde ela vive e utilizando o seu mecanismo de aprendizagem. Não existe um processo explicito de transmissão do conhecimento. Não somente o conceito de volume pode ser adquirido, outros conceitos podem ser adquiridos através do processo de interação.

As oficinas com o TOPOBO buscam justamente resgatar este processo de aprendizagem através da manipulação de objetos reais pertencentes ao universo da criança na forma de brinquedo. Duffy e Jonassen (1992) afirmam que para apreender realmente os indivíduos precisam de problemas realistas, inseridos em contextos reais.  Desta forma a criança interagindo com os objetos pertencentes ao seu mundo pode desenvolver conceitos relacionados a ciência da computação. Do ponto de vista pedagógico, alguns aspectos desta metodologia com o TOPOBO serão destacados. Um deles é que o processo de controle do aprendizagem está prioritariamente com o aprendiz e não com o professor. Isto por que o aprendiz é quem vai explorar o TOPOBO da maneira que julgar adequada e através das habilidades motoras que ele possui, e não através de normas pré-estabelecidas pelo professor.

Abordagem metodológica

A abordagem foi proposta para alunos dos primeiros anos do ensino fundamental. Em geral estes alunos possuem capacidade de ler e escrever. Inicia-se com a descoberta de um tema de interesse comum da turma. Em seguida o professor estipula que objetivos interdisciplinares quer trabalhar na atividade e assim define os conteúdos. A introdução do tema é feita através de uma explosão de ideias onde os alunos devem expor seu conhecimento prévio sobre o tema de interesse. Realiza-se a divisão da turma conforme o número de peças ativas disponíveis no  kit TOPOBO. Realiza-se a apresentação do material robótico através da demonstração das peças. Os alunos finalizam a atividade através da autoria de um desenho ou de uma escrita sobre o tema. Os passos são:

  • Escolher um tema de interesse comum da turma;

  • Traçar os objetivos a serem trabalhados;

  • Definir os conteúdos;

  • Proporcionar uma explosão de ideias com os alunos a respeito do tema de interesse;

  • Solicitar que os alunos desenhem o animal de seu interesse;

  • Dividir a turma conforme o número de peças ativas;

  • Apresentar a robótica educacional aos alunos: apresentação do TOPOBO através do funcionamento das peça;

  • Compartilhar com a turma a experiência da montagem em forma desenho ou escrita.


[1] http://www.topobo.com/videos.html

Em nosso estudo de caso, a turma foi dividida em cinco grupos, e utilizamos um Kit TOPOBO que contém 100 peças. Os grupos foram previamente definidos pelo NUEPEC (Núcleo de Estudos em Epistemologia e Educação em Ciências ) que realiza outras atividades supervisionadas com os mesmos. Optamos por abordar a montagem dos robôs em diferentes aspectos. Para o grupo A, mostramos o funcionamento da peça ativa, deixamos as peças espalhadas sobre a mesa, e pedimos que eles montassem um robô que dissesse “não” e outro que ”dançasse”. O grupo B, propomos uma variação da metodologia, mostramos os robôs montados, e contamos uma estória para as crianças, dizendo que os robôs que tínhamos em mãos Robô que dança e o Robô que diz Não tinham ”nascido” das peças que estão na mesa. Para o grupo C, foi mostrada as peças sobre a mesa e o explicamos o funcionamento da ativa. Após pediu-se que fizessem um robô com as peças. O grupo D teve a mesma dinâmica.

A última metodologia apresentada foi proposta ao grupo E, onde mostramos o robô montado e as peças sobre a mesa. Para um dos grupos, foi proposto realizar a montagem a partir de figuras.

A Figura 3 mostra o robô que representa dizer ’não’ com a cabeça. Na Figura 4 é mostrado um robô que imita o movimento de ’dançar’.

Figura 3: Robô que diz 'Não'

FIGURA 3: Robô que diz ‘não’

Figura 4: Robô que 'dança'

FIGURA 4: Robô que ‘dança’

Embora o Kit TOPOBO permita a interligação de peças ativas, optamos por utilizar uma peça ativa, a fim de minimizar a complexidade da montagem.

Neste artigo é discutido o aspecto motivacional das crianças com o kit, detalhando o trabalho com as metodologias propostas. O trabalho foi registrado em vídeo e analisados criteriosamente os procedimentos executados pelas crianças.

O principal objetivo é a montagem do robô, porém é notório que ao explorar o TOPOBO, as crianças interagem e verifica-se um aprendizado significativo através da experimentação, construção e reconstrução através do objeto de aprendizado. Do ponto de vista da aprendizagem significativa, pode-se afirmar que um estudante aprende no momento em que ele for capaz de converter e expressar semelhança, em termos de significados, entre distintas linguagens ou formas representativas, sem que permaneça dependente exclusivamente de um signo em particular para exprimir suas ideias (Ausubel, 1963). Posteriormente, descreveu-se com detalhes a metodologia aplicada com o primeiro grupo, e, embora algumas alterações na metodologia tenham sido feitas com os outros grupos, o aspecto motivacional foi bastante semelhante. Uma análise detalhada demonstrou que o Kit robótico em questão é uma peça que agrega concentração e motivação para as crianças realizarem trabalhos em grupo e superarem desafios.

Considerações e conclusões

Ao analisarmos o vídeo das oficinas nota-se que a atenção dedicada pelas crianças às tarefas era constante. No inicio, quando mostrávamos o funcionamento do robô, ou o funcionamento da peça ativa, elas se colocam em uma situação de espectadores e passivos ao que mostrávamos, não se notamdo interação entre elas neste momento. A apresentação do robô que diz ‘não’ causa um grande espanto nas crianças, elas se surpreendem com o fato de parecer que o robô responde a questões, ‘dizendo’ que não!

O video 1, mostra o fragmento de uma das oficinas onde duas duplas realizam a montagem do robô que diz ‘não’ e demostra a primeira experiência delas com as peças.Em seguida, outra construção foi mostrada, e questionou-se o que elas achavam que aquele robô fazia. Eles responderam que o robô dizia ‘sim’. Embora as respostas não estivessem corretas, foi claramente observado que existe uma dedicação em cima da ferramenta e uma associação com a função do robô anterior. Após demostrada a funcionalidade do robô, que imitava passos de dança, foi observado que as crianças ficaram intrigadas e curiosas pois o movimento fugia ao que elas previamente esperavam. Que era o robô dizer sim, fazer um movimento com a cabeça, a dança envolvia um maior movimento da criação, e isso os despertou ainda mais. Foram desmontados os dois robôs e as peças misturadas às demais na mesa. A partir deste momento duplas de crianças iniciaram a montagem de um robô que repetisse a função de dizer “não”. Após algum tempo de observação optou-se por entregar uma foto (modelo) do robô montado para que elas seguissem, pois se observava que somente com as peças em mãos elas não iriam avançar, mas continuavam tentando, pegando as peças de forma aleatória, observando os encaixes. Foi também observado no início das atividades, que as crianças do grupo, pouco interagiam, sua atenção estava voltada para explorar as peças. Quando iniciavam a encaixar as peças, a interação aumentava, e começam a troca peças entre elas e a sugerir conexões, a fim de montar o robô.

 Robô que ‘diz não’

As crianças se mantinham concentradas nas peças e no modelo (foto do robô), o tempo todo. Observou-se a partir de então que a interação entre elas aumentou, pois precisavam recorrer umas às outras para que as peças fossem alcançadas. Notou-se também que elas não discutiam funcionalidades ou conexões, mas observavam o que a outra dupla fazia. Então uma dupla exclamou:, “Acabou!”, uma clara satisfação em ter realizado a tarefa e uma ansiedade por testar a funcionalidade, ou seja, comprovar se a criação montada diria “não”.

Elas esperaram ansiosas para conectar o cabo de energia e programas através do mecanismo de memória cinética à criação. Esta atividade aconteceu automaticamente, bastou alcançar o cabo e eles fizeram a conexão e realizaram todos os procedimentos para que o robô programado fizesse o movimento de “não” com a cabeça. A figura 3 mostra o robô montado e a seta em negrito demonstra o movimento executado. Durante a análise, todavia, alguns estímulos externos, mesmo dentro dessa faixa de captação não foram percebidos em função das experiências anteriores, do grau de atenção e motivação do sujeito que é exposto ao fenômeno (Silva, 2010). A intimidade com as conexões elétricas/eletrônicas é notória e inata nas crianças analisadas. Conhecer implica atividade do sujeito, o que implica uma perspectiva de interação entre as sensações do mundo exterior e as capacidades de perceber do cérebro (Silva, 2010). Enquanto isso, a outra dupla seguia montando o robô. Eles focavam-se no modelo da foto e no modelo criado pela dupla que executou primeiro a tarefa. Com as peças em mãos, moviam-se mais rapidamente para montar. O foco e a concentração nas peças e no modelo ficaram maiores.

A dupla que montou primeiro interagiu pela voz, e pediu para que o robô dissesse “não”. Assim, risadas aconteceram e um ar de satisfação tomou conta da dupla em função da resposta positiva do robô ao comando. Enquanto a dupla não havia concluído a criação, optamos por solicitar modificações na programação, como por exemplo que o robô dissesse “não” mais rápido. Prontamente manipularam a criação para que esta tarefa fosse executada. Após o termino da criação pela segunda dupla, eles fizeram os mesmos testes de programação, que era dizer “não e dizer “não” mais rapidamente. Nota-se que a satisfação não era a mesma, pois eles terminaram após a outra dupla, mas se mantiveram interessados.

A segunda montagem utiliza somente uma peça ativa, porém disposta de forma diferente a fim de representar um movimento no corpo do robô imitando os movimentos em forma de dança. No video 2 é possível acompanhar a criação deste robô em um fragmento da oficina.

 Robô que ‘dança’

Então mostramos o modelo através de uma foto do robô que “dança” e solicitamos que eles o montassem. Notou-se nesta etapa um entendimento maior por parte das duplas. Ambas iniciam a montagem pela peça ativa. Observou-se que houve uma apropriação da função da rotação do motor, de que era aquela peça que permitia à criação executar as tarefas, dizer “não” e “dançar”. As crianças levantaram-se da cadeira para melhor acomodarem-se e  agirem com as peças sobre a mesa. Em função de o trabalho estar sendo realizado em grupo, e de somente uma peça ativa ser necessária para executar a construção, ocorre que, quando uma das crianças da dupla tomou em mãos a peça ativa, a outra ficou observando o modelo da foto e o que a criança que tem a peça ativa está montando, tendo tomado a função de sugerir peças. A outra criança espontaneamente inicia a montagem da cabeça, a qual tem a conexão somente com peças  passivas. Ao mesmo tempo em que estão conferindo o modelo também estão interagindo com mais frequência. Nessa situação, a dupla que na primeira montagem terminou tardiamente em relação ao primeiro grupo, agora termina primeiro. Observamos que existiu uma maior reflexão entre eles antes de colocar as peças. Eles tinham confiança no que  estavam montando e se o que foi montado refletia o modelo. Solicitamos que eles fizessem o robô dançar outra música, e eles associaram a alteração da programação, em função da velocidade e do tempo, e reprogramaram a peça ativa, fazendo com que ele “dançasse” mais rápido.

Quando a dupla que se encontrava tardia na montagem, concluiu, exclamaram “terminamos!”. A aprendizagem torna-se então um processo de cuidado para que esse amadurecimento aconteça (Silva, 2010). Mais que depressa uma das crianças se levanta e vai em direção do robô que estava funcionando para retirar o cabo de energia e testar a criação deles. As crianças ficam paradas e concentradas para ver a criação entrar em funcionamento. O tempo total da atividade foi de aproximadamente vinte minutos. Os artefatos tecnológicos produzem sentimentos de curiosidade e motivação muito grande nas pessoas. Pode-se notar que crianças ficam muito interessadas nesse tipo de material, evidenciando forte interesse na manipulação e na resolução de problemas. Comprovou-se que o uso da tecnologia desencadeia processos mais profundos de concentração, pois o sujeito mantém foco no cumprimento da tarefa. Além disso, mesmo a atividade possuindo relativo grau de dificuldade, o sujeito se sente desafiado e empolgado na busca da solução, mostrando-se compenetrado e focado.

Consideramos positivamente o fato de, durante as explicações de funcionamento, os alunos permanecerem em silêncio e observando cuidadosamente as explicações, mostrando concentração. Durante a montagem embora um dos membros do grupo tomava a frente, o outro membro da dupla explorava as peças, e contribuía para executar a tarefa. Durante a finalização da construção, ambos se interessam por explorar o robô e fazendo testes através da programação do equipamento.



Referências


Ausubel D. P. (1963). The psychology of meaningful verbal learning. New York: Grune and Stratton.

Bichara, I. D. (2001). Brincadeiras de meninos e meninas: segregação e estereotipia em episódios de faz-de-conta. Temas em Psicologia da SBP, 9 (1), 19-28.

Brascher A. C. (2000). Objetivos socio emocionais das atividades de conhecimento físico. Ciência & Educação, 6(2), 75-87.

Dohme, V. D. (2002). Atividades lúdicas na educação: O caminho de tijolos amarelos do aprendizado (Dissertação de Mestrado). São Paulo: Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Duffy, T.M., & Jonassen, D.H. (1992) Constructivism and the Technology of Instruction: A Conversation. Lawrence Erlbaum Associates.

Edda, B. (2003). A brincadeira de faz-de-conta: lugar do simbolismo, da representação, do imaginario. São Paulo: Ed.Cortez.

Parks, A. Raffle, H., & Ishii, H. (2008). Topobo in the wild: Longitudinal evaluations of educators appropriating a tangible interface. In Proceedings of CHI ’08: the Twenty-Sixth Annual SIGCHI Conference on Human Factors in Computing Systems. (1129-1138). New York: ACM.

Queiroz, N. L. N., Maciel, D. A., & Branco, A. U. (2006). Brincadeira e desenvolvimento infantil: um olhar sociocultural construtivista. Paidéia (Ribeirão Preto), 16(34).

Silva, C. C. B. (2003). O lugar do brinquedo e do jogo nas escolas especiais de educação infantil (Tese de Doutorado). São Paulo: USP, Instituto de Psicologia.

Silva, J. A. (2010). Sensação e percepção no contexto dos estudos sobre aprendizagem. Teorias            da          Aprendizagem  e            Processos Cognitivos. Universidade      Federal               do         Rio        Grande, Núcleo de Estudos em Epistemologia e Educação em Ciências.

Ullrich, R. A. (1987). A Robótica: uma introdução. Rio de Janeiro, RJ: Campus.

Vygotsky, L. S. (1991) . A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: Martins Fontes, 4a ed.