Sensos-e Vol: III Num: 1  ISSN 2183-1432
URL: http://sensos-e.ese.ipp.pt/?p=11148

Aplicações multimédia – um recurso educativo na exploração de coleções museológicas

Autor: Maria Joao Mota Afiliação: Nenhuma

Resumen: As instituições museológicas têm um papel determinante na salvaguarda física dos seus acervos, mas também uma grande responsabilidade na sua investigação e divulgação. Existem, contudo, limites que a conservação impõe à divulgação de coleções mais frágeis, como é o caso das coleções têxteis, e que comprometem essa função essencial de difusão do conhecimento.
Tentando superar este tipo de constrangimento, o Museu de Aveiro desenvolveu uma aplicação multimédia subordinada ao tema da paramentaria religiosa, que conjuga texto e imagens inéditas, numa solução inovadora que permite uma aprendizagem apelativa, eficaz e interativa, a qual não esquece a vertente lúdica.


Palabras-Chave: Museus, comunicação, têxteis, interatividade, multimédia.

Abstract: Museums are institutions with a crucial role in the conservation of museum collections, in their dissemination and in research. There are, however, limitations that conservation imposes on the display of certain more fragile collections, as is the case with collections of textiles, and this limits the Museum in one of its foremost functions. In an effort to overcome this type of constraint, the Museum of Aveiro has developed a multimedia application on the theme of religious vestments, which combines text and previously unseen footage in an innovative medium that fosters appealing, effective and interactive learning, and that also includes an element of fun.
Keywords: Museum, communication, textiles, interactivity, multimedia.

Aplicações multimédia – um recurso educativo na exploração de coleções museológicas

Autor: Maria Joao Mota Afiliação: Nenhuma

Particularidades das coleções têxteis

As coleções têxteis reúnem, regra geral, uma enorme diversidade de tipologias de peças, com as mais variadas funções e proveniências. O seu estudo e análise revelam-se tão mais importantes quanto permitem a compreensão dos contextos social, político, económico e religioso dos períodos em que se inserem.

 Concomitantemente a esta relevante vertente histórica e documental, estes acervos espelham o que, durante séculos, de melhor se produziu no universo das artes e ofícios. Reconhecidos pintores, desenhadores, ourives e bordadores criaram desenhos destinados a serem reproduzidos por bordadores e tecelões, que assim realizaram algumas das mais magníficas peças que hoje podemos encontrar nos museus e palácios portugueses.

 

Confeccionados com materiais extremamente frágeis, os têxteis exigem rigorosos cuidados no seu manuseamento, exposição e acondicionamento, fragilidade que se reflete, com frequência, num deficiente estado de conservação, inviabilizando a sua exposição e “atirando” estes acervos para os espaços de reserva.

Perante esta situação, generalizada a grande parte das instituições museológicas, torna-se necessário refletir sobre soluções que possam, de alguma forma, minorar estas limitações, garantindo a divulgação e fruição destas coleções desconhecidas do grande público.

 

Coleção de têxteis do Museu de Aveiro[3]

O Museu de Aveiro, instalado no edifício quatrocentista do extinto Convento de Jesus, foi herdeiro de uma notável coleção de arte sacra oriunda de várias igrejas e conventos nacionais, da qual se destaca um núcleo de aproximadamente seiscentos e cinquenta paramentos e alfaias religiosas, do séc. XV ao séc. XIX. (Foto 1)

Foto 1

Foto 1 – Museu de Aveiro

Aquando da fundação do Museu (1912), então com a segunda maior área de exposição do país, os têxteis assumiram uma enorme importância e visibilidade no circuito de exposição permanente, com três grandes salões dedicados à sua exposição. Muitas dessas peças, de grande valor artístico e histórico, haviam já circulado e continuariam a figurar em exposições nacionais e internacionais[4], ombreando com o que de melhor existia na Europa. (Foto 2)

Foto 2

Foto 2 – Casula de festa vermelha bordada a pontos de ouro (séc. XVIII). Museu de Aveiro

Contudo, esta situação viria a alterar-se na década de 1980 com a crescente preocupação e atenção dada à conservação preventiva das peças. A exposição permanente de têxteis passou a ser totalmente desaconselhada, levando a que a coleção fosse definitivamente retirada do circuito de visita e acondicionada em reserva, passando a ser apresentada apenas, e esporadicamente, em pequenas exposições temporárias.

Em 2008 o Museu reabriu com um novo projeto de requalificação arquitetónica[5], o qual contemplava uma sala para a exposição rotativa de têxteis. Esta, contudo, não chegou a ser implementada por falta de orçamento para aquisição de vitrinas, pelo que, perante esta impossibilidade, o Museu decidiu candidatar ao QREN[6] um projeto destinado ao desenvolvimento de uma aplicação multimédia que permitisse revelar este acervo, há muito tempo afastado do público.

 

A Multimédia ao serviço dos museus

Sendo certo que a observação direta dos objetos constitui uma das componentes mais ricas e essenciais de qualquer instituição museológica, não deixa de ser verdade que nem sempre os visitantes possuem os conhecimentos necessários para compreender esses objetos sem ajuda interpretativa.

Neste sentido, quaisquer formas encontradas pelos museus para enriquecer o diálogo com os objetos, resultam em fatores potenciadores da compreensão e fruição dos mesmos, transportando o visitante para outro nível de aprendizagem e de satisfação[7]. Das múltiplas soluções passíveis de reforçarem essa comunicação, a exploração dos conteúdos através da utilização das novas tecnologias vem ganhando cada vez mais adeptos. Em comum, os meios multimédia apresentam, geralmente, uma forte componente interactiva, permitindo ao visitante explorar os objectos e todas as suas ligações de uma forma participada, desfrutando da satisfação de construir o seu próprio conhecimento.

São numerosos os exemplos já testados e concretizados que, de forma extremamente criativa e inovadora, e de acordo com os recursos de cada instituição, reforçam o papel comunicativo dos museus.

Embora a análise de públicos ainda não constitua uma prioridade de grande parte dos museus, existem já estudos concretos sobre os efeitos da utilização das novas tecnologias nestes espaços, nomeadamente nas fases de preparação da visita, no decorrer e depois da mesma.[8]  De acordo com estes estudos, verifica-se que essa utilização pelo público vai decrescendo ao longo destas três etapas, sendo feita sobretudo na primeira, também designada de fase de descoberta, na qual as redes sociais e os sites institucionais assumem um papel dominante. Já na fase de visita, e comparativamente à fase anterior, a utilização das novas tecnologias decresce. Aqui, a diversidade de soluções adoptadas é contudo bastante alargada, sendo abundantes os recursos hoje oferecidos pelos museus com o objectivo de tornar a visita numa experiência enriquecedora e estimulante: audioguias tradicionais; aplicações para dispositivos inteligentes com enfoque numa exploração mais personalizada; plantas tácteis que permitem o acesso a zonas fora do circuito de visita, como reservas, e a toda a informação associada a esses espaços; salas multimédia que ajudam o visitante a aproveitar os múltiplos recursos e oportunidades do museu[9]; QRcodes com acesso a informação adicional mais aprofundada; aplicações com detalhes sobre as coleções, entrevistas com conservadores, artistas ou comissários das exposições; experiências com realidade aumentada; beacons; tecnologias sensoriais[10], entre outros, fazem hoje parte do universo de meios à disposição do público.

Neste sentido, o processo de exploração e descoberta das coleções tem beneficiado de inovações sem precedentes, possibilitando ao visitante romper com a tradicional visita linear e partir à descoberta partilhada dos espaços e objectos. A visita transforma-se, assim, numa experiência personalizada ou, como diria Maria Luísa Gant, numa experiência “a la carte”[11], que responde directamente aos interesses dos visitantes, ao grau de profundidade de informação que pretendem, fomentando, assim,  um conhecimento aberto e participativo em que o utilizador controla a sua própria informação.

Não obstante esta evidente alteração do paradigma de comunicação no mundo dos museus, certo é que grande parte destas inovações implica fortes investimentos, não só para assegurar as fases de criação e implementação dos sistemas, mas a sua posterior manutenção. Em Portugal, grande parte das experiências desenvolvidas por museus, núcleos museológicos ou centros interpretativos, têm sido possíveis graças a candidaturas a fundos comunitários ou outros, situação que, em muitos casos, tem redundado em graves dificuldades ou mesmo incapacidade em manter em funcionamento esses dispositivos, dadas as necessidades constantes de manutenção e reparação dos equipamentos.[12] Esta situação é ainda mais frequente quando se trata de instituições sob a tutela da administração pública com carências orçamentais crónicas. É pois aconselhável que a opção por investimentos feitos na área das novas tecnologias tenha em consideração as limitações financeiras de cada instituição e o acautelamento da continuidade destas estruturas, sob pena de se revelarem investimentos temporários, estéreis, com reduzido retorno para o público visitante.

 

 Multimédia aplicada à coleção de têxteis do Museu

 Centrando-nos novamente no caso do Museu de Aveiro, é importante reforçar a ideia de que nunca esteve em questão a preferência pela exploração da colecção através da utilização de meios digitais, em detrimento da exposição física dos objectos. Esta opção decorreu, sim, da necessidade de superação de uma impossibilidade de expor o referido acervo.

A escolha do equipamento a utilizar resultou da ponderação de diversos fatores. Antes de mais, o facto de se pretender explorar uma coleção fisicamente inacessível, obrigava a que as numerosas imagens de grande qualidade e pormenor fossem visíveis num monitor com tamanho considerável. (Foto 3)

Foto 1

Foto 3 – Utilização da mesa digital por visitantes do Museu.

Por outro lado, do ponto de vista da forma como seria facultada a informação, tornava-se necessário recorrer a meios apelativos de conjugação de texto e imagem, disponibilizando em simultâneo o acesso visual a peças da coleção do Museu, a acervos de outras instituições, bem como a documentos relacionados com os objetos, tudo isto assegurando que o visitante pudesse escolher os assuntos que mais lhe interessassem, sem a obrigatoriedade de seguir um percurso previamente traçado. A aquisição de conhecimentos seria, assim, feita de uma forma interativa, através do acesso a informação sucinta, acessível e rigorosa, associada a imagens apelativas e didáticas. (Foto 4)

foto 4

Foto 4 – O visitante selecciona e acede à informação que mais lhe interessa.

Outra questão relevante relacionava-se diretamente com a acessibilidade. Tendo em consideração os vários tipos de público que habitualmente nos visitam, pretendia-se encontrar uma forma não exclusiva de apresentação da informação, assegurando que a falta de aptidão ou familiaridade com os meios informáticos não fosse impeditiva ou inibidora do uso do equipamento escolhido[13].

Ponderadas todas estas questões, considerou-se que, de entre as várias soluções possíveis, a mais favorável passaria pelo desenvolvimento de uma mesa customizada, munida com um ecrã de 42 polegadas, de gama profissional, com tecnologia multitoque (tecnologia óptica). O equipamento, com uma disposição tilted, com inclinação de 45º, possibilitava o acesso dos diferentes públicos, incluindo crianças e pessoas com mobilidade reduzida. (Foto 5)

Foto 5

Foto 5 – Adaptação do equipamento aos vários tipos de público

Concluída a escolha do equipamento, seguiram-se as fases de investigação e seleção dos conteúdos. A aplicação intitulada “Os têxteis no culto religioso” foi, então, dividida em quatro núcleos, sendo os dois primeiros de âmbito mais geral, centrados no mundo da produção da paramentaria e da sua utilização, um terceiro direcionado a um conjunto selecionado de peças da colecção do Museu e um quarto essencialmente lúdico (foto 6).

Foto 6

Foto 6 – Painel de abertura da aplicação com acesso aos quatro módulos temáticos. Com a aplicação em descanso, o painel de abertura faz uma alteração constante das imagens de apresentação.

I –  “Encenação religiosa”

No primeiro núcleo foi abordada a importância dada pela Igreja à encenação dos espaços religiosos, desmontando a simbologia associada à forma, cor e utilização dos paramentos. Imagens de ambientes de época e de diversos paramentos e alfaias, acompanham pequenos textos, sendo parte da informação construída de forma interativa pelo próprio visitante. (Foto 7)

Foto 8

Foto 7 – Módulo em que se explica a funcionalidade das peças de paramentaria.

Esta aquisição interativa de conhecimentos é bem visível no desafio proposto pelo jogo “Consegues desenhar estas peças?” (foto 8)

Foto 7

Foto 8 – “Consegues desenhar estas peças?” é um jogo onde é dada uma breve descrição de um paramento que o visitante tem de desenhar sobre o ecrã. Em seguida este pode compará-lo com uma foto do objeto.

Aqui é dada ao visitante uma breve descrição de um paramento ou alfaia que o mesmo terá de desenhar com o dedo sobre o ecrã. Concluído o desenho, o utilizador pode aceder à imagem real da peça, comparando-a com a imagem que desenhou. Finalmente, o utilizador tem acesso a uma pintura da coleção do Museu que ilustra um paramento semelhante, no seu contexto de utilização (foto 9).

Foto 9

Foto 9 – Depois de visualizar a imagem do objeto, o visitante pode “chamar” uma imagem de uma pintura onde o mesmo se vê em contexto de utilização.

Outro aspeto abordado neste primeiro núcleo prende-se com os materiais utilizados na confeção das peças. Excelentes imagens ampliadas ao microscópio mostram, com pormenor, as diferentes técnicas de tecelagem e a riqueza dos pontos empregues na confeção dos bordados. (Foto 10)

Foto 10

Foto 10 – A ampliação de pormenores é um dos grandes atrativos da aplicação permitindo ver as técnicas impercetíveis a olho nu. Imagem do fio laminado dourado usado nos bordados a ouro (40x).

“Veja de perto…” é uma funcionalidade que permite ver ampliações (40x) de pormenores impossíveis de ver a olho nu, possibilitando uma visão incomparável das técnicas e materiais têxteis utilizados nos tecidos, nos bordados, nas passamanarias (fitas e galões) e nos forros (foto 11).

Foto 11

Foto 11 – Imagem ampliada de um tecido com fio de ouro e prata (séc XVI).

As imagens são, sem dúvida, uma das mais-valias desta aplicação, nomeadamente as ampliações de pormenores vistos ao microscópio, já que estas se convertem em preciosos auxiliares para uma compreensão mais aprofundada da técnica têxtil. Ainda neste primeiro módulo é abordado o significado das cores, dando a conhecer a sua simbologia e ligação aos respetivos períodos litúrgicos (foto 12).

Foto 12

Foto 12 – Aplicação central do frontal de altar de Nossa Sra. da Assunção (séc XVI)

II - “Da produção dos conventos às oficinas de bordadores”

O segundo módulo leva-nos a aspetos diretamente relacionados com a produção têxtil, a forma como se organizavam e funcionavam as oficinas de paramenteiros e vestimenteiros, e como se processavam as grandes encomendas. Mais uma vez se faz recurso a textos curtos e simples, acompanhados por gravuras de época exemplificativas das atividades descritas. Todas as imagens que surgem em reduzida dimensão podem ser ampliadas com recurso ao zoom (fotos 13 e 14).

Foto   6

Foto 13 – Textos sucintos são acompanhados por imagens que permitem ampliação.

Foto 7

Foto 14 – Exemplo de capacidade de ampliação de uma imagem.

III núcleo – “A coleção de têxteis do Museu”

Será com o terceiro módulo que se entra diretamente na análise dos paramentos e alfaias de uma família de paramentos da coleção do Museu, desta feita associada ao culto de S. Simão. Aqui as peças são integradas no seu contexto histórico, dando-se a conhecer a tradição do culto do Santo no Convento de Jesus de Aveiro, e a lenda associada à origem desse culto, a qual levou à construção de uma capela no claustro do antigo convento e à encomenda dos respetivos paramentos e alfaias.

Finalmente, e para dar a conhecer uma das áreas do museu de acesso interdito ao público, é feita a apresentação da reserva de têxteis mostrando a forma como são acondicionadas as peças e os cuidados tidos na sua conservação.

IV – “Será que agora já sei…”

O quarto módulo funciona como o culminar de todos os outros. Um quiz, de perguntas com resposta de escolha múltipla, permite ao visitante, de uma forma divertida, testar e consolidar os seus conhecimentos sobre os assuntos abordados. Um temporizador adaptado a este jogo permite a competição entre vários jogadores, aumentando a componente lúdica desta aplicação. (foto 15).

Foto 8

Foto 15 – Quiz “Agora já sei”, no qual o visitante testa os seus conhecimentos, podendo competir com outros utilizadores.

 

 A operacionalização do projeto

Terminada a investigação necessária à produção dos conteúdos, procedeu-se à realização dos textos e à escolha e compilação das imagens necessárias à sua ilustração, trabalho que decorreu a par da operacionalidade técnica.

Procurou-se respeitar as quatro regras básicas para uma boa comunicação audiovisual defendidas por César Carreras[14], nomeadamente, ser atractivo (ter uma boa imagem), ser breve (não requerer muito tempo de utilização), claro (quer na mensagem quer no manuseamento do equipamento) e directo (indo directo às questões).

Contudo, nem sempre este processo se desenvolveu de forma linear e sem dificuldades. A primeira dificuldade sentida consistiu na necessidade de realizar uma selecção apertada da informação produzida, centrando-nos apenas nos conteúdos que melhor apresentassem a colecção, e a integrassem nos diferentes contextos histórico, religioso, social e artístico. O excesso de informação não só resultaria na fadiga do utilizador, como acabaria por dificultar a comunicação.

Difícil foi, igualmente, a procura de fontes iconográficas relacionadas com os processos mais antigos de produção de paramentaria (módulo II da aplicação), nomeadamente pinturas ou gravuras da época que reproduzissem ambientes oficinais. Como sabemos, imagens elucidativas podem substituir descrições fastidiosas contribuindo para uma melhor percepção da realidade e para uma maior leveza no processo de comunicação. (foto 16)

Foto 16

Foto 16 – A procura de imagens de interiores de oficinas de paramenteiros foi uma das dificuldades sentidas na execução do projeto.

Outra questão, prendeu-se ainda com a lógica do desdobramento da informação. Esta, baseada na escolha sequencial de determinados screens, obrigou a múltiplas revisões, até ser conseguido um elevado nível de exploração intuitiva. Em conjunto com a empresa de software, foram estudadas e testadas diversas formas de desenvolvimento da aplicação, sempre com o objectivo de apresentar a informação de uma forma simples e esquemática, assegurando uma procura lógica e intuitiva, que, simultaneamente, estimulasse a procura contínua de mais informação. (Foto 17)

Foto 17

Foto 17 – Estudos iniciais de organização de informação com esquemas de derivação.

Por último, sentimos a necessidade de ultrapassar o inconveniente de toda a equipa do Museu ter formação académica semelhante, em História ou História da Arte, podendo esta circunstância ser limitativa do tipo e forma de informação vinculados. Uma conservadora do Museu, especializada na área de têxteis e responsável pela colecção em questão, fez a escolha e produção dos conteúdos. Os mesmos conteúdos foram sendo apresentados aos restantes colegas, todos estes especializados noutras colecções e áreas de conhecimento, mas, por outro lado, com a mesma forma de abordagem dos objetos artísticos e tipologia de linguagem. A participação dos profissionais de informática, designers e do próprio gestor de projecto, com formação menos teórica e mais próxima das necessidades do visitante comum, ajudou-nos a pensar em soluções mais eficazes e inovadoras para veicular a informação, evitando conteúdos demasiado teóricos, técnicos ou descritivos e optando por uma linguagem mais simples, de forma a garantir uma maior eficácia na comunicação. (Fotos 21, 22 e 23) Neste sentido, a interdisciplinaridade conseguida através da participação de elementos da equipa da empresa multimédia foi fundamental.

Foto 18

 

Foto 19

Foto 18 e 19– Fases de estudo do design gráfico usado na aplicação.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Conclusão

A salvaguarda dos bens patrimoniais constitui uma preocupação constante no funcionamento de qualquer instituição museológica. Contudo, a proteção desses bens não é suficiente para garantir que gerações vindouras possam vir a desfrutar desses acervos. A par da preservação, os museus têm como missão divulgar as suas coleções, primeiro trabalhando-as do ponto de vista da investigação e da produção de conhecimento e, em seguida, servindo-se de metodologias que promovam uma observação refletida das peças, potenciando a sua compreensão e dos seus contextos e ligações, contribuindo, assim, para o enriquecimento pessoal do visitante.

Como vimos, nem sempre estes dois objetivos, de preservação e de divulgação, convivem da melhor forma. A exposição é, não poucas vezes, inimiga da conservação, sendo, pois, necessário refletir sobre formas alternativas que nos permitam ultrapassar quaisquer restrições à exposição dos objetos.

Foi nesta perspetiva que encarámos este projecto, como uma possibilidade válida de colmatar uma importante lacuna na acessibilidade às coleções do Museu, garantido o acesso a um acervo de grande relevância histórica e artística, como é a coleção de têxteis do Museu de Aveiro.

Trabalhámos uma coleção fisicamente inacessível ao público e produzimos conhecimentos sobre a mesma. Explorámos o seu contexto de produção e significação. Abordámos as peças sob múltiplas perspetivas, e só então adaptámos esses conteúdos às novas exigências comunicacionais.

Hoje, o Museu dispõe de um equipamento multimédia que permite ao visitante conhecer um núcleo de peças praticamente desconhecido, podendo fazê-lo através de um sistema táctil e interativo, que alia uma apresentação apelativa, intuitiva e eficaz a uma linguagem simples e acessível, recorrendo a imagens originais de grande qualidade. (Foto 20)

Foto 20

Foto 20 – Adesão do público ao novo equipamento multimédia.

No nosso entender, os museus só têm a ganhar com o desenvolvimento de projetos que integrem equipas multidisciplinares, nomeadamente profissionais da área da multimédia. O controlo da linguagem inerente a este tipo de comunicação permite-nos estudar e testar formas simplificadas de escrita, que facilitam a compreensão de conteúdos resultantes de um trabalho sério de investigação, sem cair na erudição e complexidade de uma informação demasiado técnica.

É através da simplicidade de linguagem e do recurso a meios visuais apelativos que se consegue ampliar a compreensão dos conteúdos, fomentando a democratização do acesso a temas tidos como mais eruditos e especializados e, por esta via, conquistar novos públicos.

Concluímos três anos de utilização da mesa digital, localizada na receção do museu, e é com muita satisfação que verificámos a participação espontânea do público na exploração deste recurso, pesquisando com entusiasmo um tema à partida pouco apelativo, e acabando, invariavelmente, por se surpreender e criar interesse por novos temas até então desconhecidos (foto 7).

De realçar, ainda, que o desenvolvimento deste projeto veio suscitar a curiosidade do público em conhecer este espólio, catapultando o número de marcações de visitas orientadas à reserva de têxteis. Deste modo, não só o Museu permitiu ao visitante conhecer uma zona de acesso condicionado (a reserva), como deu a oportunidade de observar algumas das peças mencionadas na aplicação, dando a conhecer aspetos importantes relacionados com a conservação preventiva dos acervos, área fundamental da prática museológica inteiramente desconhecida do público.

Após a conclusão do projecto “Os têxteis no culto religioso”, outras experiências têm sido desenvolvidas, desta feita utilizando recursos como a realidade aumentada, dando continuidade a um percurso de experimentação de novas realidades capazes de potenciar a comunicação do acervo do Museu.

 

 

Funcionamento da aplicação

 

 


[1] Prémio APOM 2012 na categoria de “Melhor aplicação de gestão e multimédia”

Investigação, textos e guião multimédia de Maria João Mota

Desenho e codificação da aplicação de EDIGMA (gestor de projeto, José Afonso Fernandes)

 

[2] Licenciada em História e mestre em Museologia, vem exercendo funções de Conservadora no Museu de Aveiro (1988-2016), sendo responsável pelas coleções de têxteis e mobiliário. Foi coordenadora dos Serviços Educativos do Museu de 1990 a 2013. Desde 2003, vem assumindo a coordenação de projetos na área das novas tecnologias.

[3] O museu de Aveiro, tutelado de 1912 a 2011 pela administração central, reuniu, a par dos grandes museus de arte localizados nas capitais de distrito, acervos provenientes de todo o país, sendo as suas colecções de âmbito nacional. Em Dezembro de 2011, com a extinção do Instituto dos Museus e da Conservação (IMC) e a criação da Direcção Geral do Património (DGPC), grande parte dos museus passaram para as Direcções Regionais de Cultura, tendo o Museu de Aveiro sido transferido para a tutela da Direcção Regional de Cultura do Centro (DRCC). Em 2015, com a política de municipalização destes equipamentos, o Museu passou a estar sob a gestão experimental da Câmara Municipal de Aveiro, situação que se irá manter até Agosto de 2017.

[4] Várias peças da atual coleção têxtil do Museu de Aveiro figuraram em grandes exposições de arte do final do séc. XIX, nomeadamente na “Exposição Retrospetiva de Arte Ornamental Portuguesa e Espanhola de 1882” em Lisboa, na “Exposição Distrital de Aveiro” em 1882 e na “Exposição de Arte Religiosa no Colégio de Santa Joana Princesa”, em 1895. No séc. XX, já inseridas em contexto museológico, essas peças estiveram presentes na “Exposição de Arte Portuguesa em Londres”(1959), na “XVII Exposição Europeia de Arte, Ciência e Cultura” ( 1983), na “Europália” (1991), entre muitas outras.

[5] O projecto de requalificação do Museu de Aveiro decorreu entre 2006/2008 e foi da autoria do Aquitecto Alcino Soutinho.

[6] Quadro de Referência Estratégica Nacional 2007/2013. O projecto enquadrava-se num dos eixos prioritários do QREN, de estímulo à produção do conhecimento e desenvolvimento tecnológico, visando o reforço e promoção da difusão do conhecimento. A candidatura foi feita no ano de 2008, sendo a verba contemplada destinada apenas ao pagamento do equipamento e software do projecto, uma vez que os recursos humanos que deveriam assegurar a investigação e produção de conteúdos seriam assegurados pelo Museu. O projecto foi entregue à empresa Edigma e a sua execução decorreu em 2012.

[7] Não cabe nesta breve abordagem fazer uma reflexão sobre o papel questionável dos museus na educação e em que medida estes devem ser instituições com um papel educativo mais formal e informativo, ou, pelo contrário, mais informal e incentivador do conhecimento activo e participativo. Apenas nos referimos, neste caso, à questão da necessidade de contextualização dos objectos, não obstante estes mesmos objectos poderem igualmente ser trabalhados de muitas outras formas, mais ou menos criativas. Veja-se a este propósito Hawkey, R. (2006)

[8] Veja-se a este propósito Saldaña, I., & Celaya, J. (2013), p. 15, apresentado na edição 2013 de “Museum Next”.

[9] Refira-se o caso do Museu Guggenheim de Bilbau, no qual uma sala de orientação multimédia, ponto de encontro dos visitantes, disponibiliza todo o tipo de material e informação sobre o museu, sobre as suas colecções e actividades, permite a impressão de rotas, o acesso a catálogos em PDF, a jogos, e a uma enorme panóplia de material áudio visual sobre os mais variados assuntos ligados à história e actividades do Museu.

[10] Estas tecnologias de 3ª geração baseiam-se no reconhecimento facial através de sensores inteligentes. Veja-se o caso do novo sistema de guia automático “Museum Guide 2.0”, que permite que um visitante, sempre que centra mais demoradamente a sua atenção numa peça, tenha de imediato acesso a informação detalhada sobre a mesma, sendo-lhe esta disponibilizada no seu smartphone. In: Saldaña, I., & Celaya, J. (2013), p. 15.

[11] Bellido Gant, M. L. (2009),  p.15.

[12] Ao contrário do que seria expectável e certamente desejável, as candidaturas a fundos comunitários destinados à execução de projetos que incluem a aquisição de software e de hardware, não preveem contratos de manutenção e assistência, pelo que os serviços prestados pelas empresas especializadas cessam imediatamente após a conclusão e entrega dos projetos.

[13] De facto, outras experiências realizadas no Museu, resultantes da colaboração do Museu de Aveiro com o Departamento de Comunicação e Arte da Universidade de Aveiro (DECA), nomeadamente no desenvolvimento de protótipos de QRCODE ou de Realidade Virtual, não surtiram o efeito pretendido junto do público. Não só porque os dispositivos electrónicos necessários ao funcionamento da aplicação não estavam ao alcance de todos, mas porque a qualidade da rede no interior do Museu não facilitava a rapidez de consulta, estes projetos não trouxeram as mais-valias esperadas para comunicação com o público.

 

[14] Carreras, C. (2009).



Referencias


Referências

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Carreras, C. (2009). Comportamiento del público frente a las tecnologías en el museo. Museos, nuevas tecnologías y sociedad, (29), 20-23. Disponível em  https://issuu.com/amigosdemuseos/docs/amigos_de_los_museos_29/13

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